Terrorismo em Brasília: professora dá dicas de atividades para trabalhar patrimônio histórico, cidadania e respeito à democracia

Literatura pode ser usada de forma lúdica para abordar fatos históricos reais. Livro Incêndio no Museu, da escritora Isa Colli, é exemplo

O ano letivo começa em fevereiro na maioria das escolas públicas e privadas do país. Um tema importante que avaliamos que deve entrar nos debates e até no currículo é o ataque ocorrido no dia 8 de janeiro de 2023, quando vândalos invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes da República, em Brasília.

O jornalista e mestre em Comunicação pela UnB João José Forni aponta, em artigo publicado no site Congresso em Foco, que “não há registro, ao que se sabe, tanto no Império quanto na Velha República, de invasão ou depredação às sedes do Executivo, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso Nacional na forma como aconteceu neste domingo em Brasília. Nem após 1930, até nossos dias, apesar de todas as crises políticas que marcaram a história do país nesse período, por mais graves que fossem.”

“Travestidos de patriotas e fantasiados de brasileiros, eles invadiram e depredaram prédios, o patrimônio público e o acervo cultural, com requintes de ódio e métodos selvagens”, acrescentou Forni.

As investigações darão conta de punir os responsáveis por tamanha barbárie. O episódio, no entanto, ficará marcado como um dos fatos mais tristes e vergonhosos da história política brasileira.

E aí surge a pergunta: como abordar esse assunto nas escolas de forma a envolver os alunos e mostrar a responsabilidade que cada cidadão tem com a conservação do patrimônio público?

Convidamos a doutoranda da UERJ, mestra em Educação Básica e professora da rede pública Adriana Querido para ajudar nessa missão. A educadora nos conta as experiências que já vivenciou com seus alunos e sugere atividades para trabalhar em sala de aula.

“Os episódios de destruição ocorridos no dia 08 de janeiro de 2023 nos assustam e causam perplexidade, pois vão além da destruição do bem público, mas de nossa memória e cultura que não foram valorizadas, tampouco preservadas. Como professora, reconheço a minha função e meu papel social além dos muros da escola. Entretanto é nela que, como um microcosmo da sociedade e local onde relações são construídas, que a difusão e reconhecimento da cultura e das artes deve começar”, ressalta Adriana.

A educadora afirma que a escola, seus profissionais e ações como espaço de conhecimentos culturais e trocas entre os pares, também é de suma importância no processo de reconhecer a nossa cultura.

“Precisamos saber quem somos como povo e construção da nossa identidade e não como partes que discordam de determinadas posições e destroem o que pertence a todos. Uma identidade que seja além de sermos considerados um povo alegre, criativo, caloroso… mas o reconhecimento de nossas origens, história e representatividades culturais, o que inclui as obras lamentavelmente destruídas. Observar algo dessa ordem, é, além de chocante, inadmissível, tratando-se de um patrimônio que conta nossa história, de nosso povo, nossa origem e representações de época que não podem ser esquecidas”, destaca.

Para Adriana Querido, os currículos podem e devem ter cada vez mais a representação dos estudos sobre as artes e o respeito pelas obras nacionais, seus autores, autoras e biografias.

“Este é um passo fundamental para a identificação dos alunos, que não veem as obras como algo distante, mas como a expressão e o olhar sensível de quem conta histórias, revela desigualdades, costumes e outros elementos caraterísticos de cada momento do povo brasileiro e estabelece proximidade com quem as conhece e admira”, revela.

A professora conta que nas aulas de literatura e suas vinculações históricas, busca com a arte das palavras e todo o seu potencial, associar os movimentos literários às demais expressões artísticas e às obras de arte, pois isto também é construção de memória.

“Sempre há uma conversa que relaciona cada autor, autora, sua obra e o que ela representa com uma relação de nosso tempo presente. Temos a internet como nossa aliada e na falta de condições de visitas presenciais, o tour virtual é um importante aliado para as nossas aulas.

Adriana dá um exemplo: “em comemoração à Semana de arte Moderna, realizamos seminários, nos quais os próprios alunos fizeram apresentações sobre as pesquisas realizadas após debates e sessões de vídeos informativos sobre o assunto abordado. As turmas tiveram a oportunidade e conhecer, analisar as obras, conhecer os artistas, o objetivo da Semana de 1922, o legado deixado e toda a sensibilidade que a arte desperta. Abrir os olhos com outros olhares , olhares da arte é, sim, construção de memórias. São essas memórias que não podem ser esquecidas para que episódios dessa natureza não se repitam e choquem a nossa sociedade e o mundo”, reforça Querido.

Sugestões de atividades para trabalhar em sala de aula:

1. Roda do conversa, fala e escuta

Será interessante, como ponto de partida, ouvir os alunos para saber como processaram os atos de vandalismo em Brasília. Após a fala de cada um, a professora pode ressaltar a importância de preservar o patrimônio histórico-cultural e que esse cuidado começa na infância.

Cedo que se deve ensinar que não se pode pichar cadeira e parede na escola, destruir mesas e cadeiras; assim como não se pode destruir espaços públicos. Cidadão consciente não comete ato de vandalismo contra seu próprio patrimônio.

2. Trabalho de grupo

Apresentações em grupos para envolver alunos, que devem preparar pesquisa prévia em jornais, revistas e sites sobre o tema ocorrido em 8 de janeiro.

3. Seminários

Esse tipo de evento pode envolver todas as turmas e o convite para participar pode ser estendido a colégios vizinhos. Uma sugestão é convidar especialistas em patrimônio histórico, jornalistas que participaram da cobertura dos atos de destruição das sedes dos Três Poderes e historiadores para falar no seminário.

4. Livros sobre o tema

No livro “Incêndio no Museu”, da editora Colli Books, a escritora Isa Colli mostra às crianças a valorização do Museu Nacional, espaço tão importante, que um dia abrigou a família imperial e foi atingido por um trágico incêndio em 2018.

É uma história leve e emocionante, que mistura ficção e realidade sem perder a medida. Na fábula, os animais do zoológico são os heróis que ajudam os bombeiros a apagar as chamas que consumiram a instituição científica mais antiga do país.

Os animais dão exemplo de heroísmo ao encarar as chamas para recuperar peças arqueológicas e relíquias do acervo.

Para Isa, nada trará de volta o que as chamas consumiram naquele dia, mas ela conta que esta obra é oportuna para falar sobre a preservação do nosso patrimônio.

“Para as crianças que não conheceram o museu, eu trago um pouco das riquezas daquele local e, ao mesmo tempo, alerto que precisamos cuidar dos nossos bens culturais”, conta.

5. Mostras culturais

Organizar exposições com representações literárias e pinturas (recriação de obras)

6. Filmes e documentários

Organizar projeção de programas jornalísticos, documentários ou filmes sobre patrimônio histórico (para turmas do ensino fundamental II ou ensino médio)

Sugestão:

Programa Panorama sobre preservação do patrimônio histórico

Programa Panorama da TV Cultura – “A preservação do patrimônio histórico; de 18/09/2018

Link: https://m.youtube.com/watch?v=u6IOE6k3ylE

Resumo:
O Panorama pega como gancho o incêndio no Museu Nacional, no Rio de Janeiro, para discutir a preservação do patrimônio histórico, cultural e arquitetônico do Brasil. Quais têm sido as políticas públicas voltadas para essas questões? Como se dá a gestão de riscos e as ações de proteção, prevenção e resolução de problemas envolvendo o patrimônio?

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